Este é um momento marcante para a cidade: o Rio guina... para o futuro!
Nenhum carioca ficará incólume, nenhum carioca pode ficar indiferente.
Esta é também uma das minhas formas de participar: sugerir caminhos para o Rio.
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quarta-feira, 30 de outubro de 2013

Perimetral: rápido como quem rouba...



[E nem vou perguntar onde estão as vigas desaparecidas...]


Não é altamente estranha a pressa com que a prefeitura do Rio se dispõe a implodir a Perimetral?... Afinal, se querem substituí-la por outra via expressa, por que não construir antes a via expressa?... A parte principal desta via, um túnel sob o Centro do Rio, ainda demora a ficar pronto: por que destruir a Perimetral antes disso?...

Em 24/11/2011, falando a O Globo, o prefeito Eduardo Paes disse: “Derrubar a Perimetral é a última coisa que vai acontecer, depois que tivermos o túnel como alternativa.”

No entanto, a partir daí fizeram tudo para demolir a Perimetral, e já!... 
Está sendo aplicada a manjadíssima “política do fato consumado”... Enquanto isto, a consciência geral é muito lerda... A proximidade do desastre está acordando a população, que tem se manifestado, ainda que esparsamente, e é mais um motivo de urgência para o prefeito, que não quer perder sua “janela de oportunidade”...

O túnel da Via Expressa está longe de ser concluído, a prefeitura reconhece que as Vias Binárias são para acesso interno ao Porto "Maravilha" (não atendem a um fluxo rápido e intenso) e faltam três anos para as míticas Olimpíadas (que servem de desculpa para tudo, disse ele): então, por que começar a destruição da Perimetral antes de construir a substituta?... Por que a pressa?...

Por uma razão simples: ninguém garante que dará certo...

As desculpas surgirão (“houve erros de projeto”), a culpa será jogada sobre os cariocas (“o Porto Maravilha não é área de passagem”) e logo outras soluções mágicas (para felicidade das mesmas empresas) serão efetivadas... Talvez seja este o propósito fundamental: destruir para construir. E destruir de novo para construir de novo. E que haja sempre um novo projeto a ser pago pelos cofres públicos...

Será que o Porto "Maravilha" não é, em si, um “erro de projeto”?... Ou melhor, será que o Porto "Maravilha" não é, todo ele, um erro?...
Há gente que pensa que estas mudanças urbanas têm razões técnicas... Não percebem (será mesmo?...) que a técnica está sempre a serviço do poder, o da política ou o dos negócios... A governança local pelo “método patético” é um bom exemplo.

Outros, ao apoiar a derrubada da Perimetral, dão como motivação (ou desculpa?) a evolução do “design urbano” (que é uma versão “maquiada” das "razões técnicas"), como se a cidade fosse um mero objeto (muito valioso...). É um conceito que está na moda e a toda hora vira notícia em O Globo, que promove eventos e seminários, indicação do sentido que tem. Na busca de “consenso”, os divulgadores e propagandistas dos projetos “revitalizadores” se esforçam para ressignificar conceitos, como na recente exaltação à “gentrificação” do Rio de Janeiro...

Cabe aqui citar a prof. Otília Arantes, in A Cidade do Pensamento Único: Desmanchando Consensos : “Associados aos políticos, ao grande capital e aos promotores culturais, os planejadores urbanos, agora planejadores-empreendedores, tornaram-se peças-chave dessa dinâmica. Esse modelo de mão única, que passa invariavelmente pela gentrificação de áreas urbanas "degradadas" para torná-las novamente atraentes ao grande capital através de mega-equipamentos culturais, tem dupla origem, americana (Nova-York) e européia (a Paris do Beaubourg), atingindo seu ápice de popularidade e marketing em Barcelona, e difundindo-se pela Europa nas experiências de Bilbao, Lisboa e Berlim.”



Dentro do “design urbano” entram os famosos “prédios-âncora”, como seriam, no Porto “Maravilha”, os museus do Mar e do Amanhã, acrescidos de esplanadas, cercadas de prédios longilíneos, por onde passam bondinhos estilizados (igualzinho às mais modernas cidades européias...), aquele tipo de urbanização que dá lindos desenhos ilustrativos. Pena que sobre o transeunte, mero detalhe na paisagem, um vultozinho na imagem da ampla praça vazia, baterá um sol (ou chuva) tropical, carioca e brasileiro, de rachar a cuca de qualquer um (não dos designers, que não vivenciarão o projeto concreto)...

Ora, se haverá uma esplanada junto à estação de desembarque da Praça Mauá, dos museus do Mar e do Amanhã e do entorno do morro de São Bento junto à baía, e se este espaço é para o pedestre, para o turista, então por que não aproveitar a Perimetral como uma fonte de ideias (e de sombras) frescas?...

Se fizeram um jardim sobre um elevado, o HighLine, em Nova York (veja o vídeo), por que não fazer, no Rio, um parque por baixo da Perimetral, bem conservado (dinheiro não falta...), iluminado à noite, na sombra de dia?...

A Rodrigues Alves, vindo da Rodoviária, mergulhará no túnel e, a partir deste trecho (Armazém 8), e não teremos mais veículos, apenas, a passeio, o VLT... Com a Perimetral sobre eles, os pedestres estarão protegidos e acolhidos. 
Pois, sem recursos oficiais, sem maiores projetos, isto já aconteceu na Praça XV: a criatividade popular fez surgir a Feira de Antiguidade, aos sábados e, aos poucos, uma espontânea feira de produtos e serviços populares, que atende a quem pega as Barcas. 

O cúmulo da ironia é que a Perimetral, uma via expressa para carros, será substituída por um túnel, em que passará outra via expressa... para os mesmos carros!...

Ora, se o prefeito e o governador do Rio se entendem tão bem, se estão imbuídos do mais alto espírito público, por que eles não propõem (e são ideias que já foram postadas aqui) que passe por este túnel (em vez de três quilômetros de carros embutidos) um ramal do BRT TransBrasil ou, muito melhor, uma linha nova do Metrô (que nem em Curitiba o BRT dá mais conta)?...

Afinal, vem aí (aguentemos!...) a derrubada da Perimetral, atendendo fielmente à cartilha da modernização das cidades “internacionais”.
Em texto sobre a aplicação desta “cartilha” (Pátria, Empresa e Mercadoria - Notas sobre a estratégia discursiva do planejamento estratégico urbano”), o prof. Carlos Vainer (IPPUR-UFRJ) afirma que, no Rio de Janeiro, “um consórcio empresarial e associações patronais, em parceria com a Prefeitura, conduziram o processo de maneira absolutamente autoritária e fechada à participação de segmentos de escassa relevância estratégica”. 
Sabemos bem disso, mas há mais... Vivemos uma versão cruel do velho provérbio “os cães ladram e a caravana passa”: nós, os cariocas, somos os cães, explorados por um insensível laboratório de “design urbano”...
Em suma, tudo já foi falado: o presente está dominado.
Mas, pergunto: que gosto terá este futuro mal passado?...

8 comentários:

Regina Bienenstein disse...

Um texto que vale a pena ser lido. Recomendo para estudiosos dos problemas urbanos e cidadãos interessados na construção de cidades mais democráticas.

Débora Vasconcellos Chaves disse...

O prefeito está apostando no caos completo...eu estou preocupadíssima, pois ir para Niterói já virou uma gincana nesses dias de obras e interrupções. Com o fechamento da perimetral vai ser o maior nó da história. E ele está perto de acontecer... tomara que eu esteja errada!
(via Facebook)

Carlos Alberto Dias de Campos disse...

Fui à Feira da Pça XV, sábado, e vendo aquela estrutura (Perimetral) fiquei com meus botões indagando se ao invés de colocá-la abaixo, aproveitassem seu leito para fazer correr um VLT, uma linha de bondes como em países da Europa, leves, rápidos, modernos, com estações servidas com escadas-elevadores, uma faixa para bicicletas, e motos até 125cc, uma forma de aproveitar o que já está lá , construído, firme, que vai do Caju até o S. Dumont.

Cláudia Versiani disse...

Eu vou perguntar: onde estão as vigas desaparecidas? Vai ficar por isso mesmo? Quem tá investigando? Qualé, gente?

Claudia Madureira disse...

Não consigo calar. Quando no IPP, elaboramos, na gestão César Maia, com Sirkis como Secretário de Urbanismo, um plano, que foi chupado por Eduardo Paes. Tudo foi maximizado, apesar de aproveitada a legislação muito bem estudada na época, por sinal. O chute no pé começou na própria gestão, quando o filho de Cesar (Ave!) e Solange Amaral fizeram uma espécie de Favela Bairro no Morro da Conceição, todo ele uma APAC, com 5 monumentos tombados (Fortaleza, Igreja de São Fco. da Prainha, Pedra do Sal e Jardim do Valongo). Destruíram muro antigo (séc. XVII/XVIII início), cimentaram as escadinhas da Conceição e puseram mesinhas de jogo em concreto, horrendas, frente à Ladeira da Pedra do Sal (antiga Quebra-bunda). Veio Paes e triplicou o Índice de Aproveitamento da área, gabaritos, ou seja, adensou a região. Os projetos de infraestrutura foram mantidos, para um uso que triplicou.
Quanto à Perimetral, nunca nos passou pela cabeça destruí-la sem a alternativa de uma via em subsolo, o que tornava caríssima a obra. Optou-se então por um mergulhão, que seria enterrado apenas entre a Pça. Mauá e o Morro da Saúde, por ser uma extensão natural da Área de Negócios do Centro. Haveria um grande estacionamento sob a Pça. Mauá, acessível pelo mergulhão. O binário criado serviria para a penetração da área, como circulação interna. Havia toda uma política habitacional proposta. Havia falhas, é claro, mas o projeto foi transformado num monstro de sete cabeças.
Desculpem a verborragia, mas até no nome o outro projeto sugeria coisas menos espetaculosas. Denominava-se "PORTO DO RIO - Plano de Recuperação e Revitalização da Região Portuária do Rio de Janeiro". O atual é PORTO MARAVILHA (maravilha?).

Marcos disse...

A forma como está sendo feita a substituição da Perimetral pela Via Expressa (destruir antes de construir a alternativa) é deveras ruim, mas eu sou um eterno defensor que carros particulares não devem ir ao Centro incólumes. Deve-se cobrar pedágio, extinguir as vagas públicas e tornar a vida do motorista solitário (aquele que está sozinho no seu carro) um inferno.
O Rio ainda carece de transporte público decente, mas se nunca dermos o primeiro passo (ainda que já saibamos que sofreremos nos próximos pares de anos), jamais melhoraremos essa desgraça que é o trânsito do Rio. O que queremos? Bater recordes de congestionamentos diários como São Paulo? Ou queremos poder pegar um ônibus bom e chegar rápido ao centro, de maneira econômica?

Teresa Martins disse...

Estou totalmente perplexa com tamanho desvarios em relação à Perimetral.
Tanto em Barcelona como em Puerto Madero, Buenos Aires, não havia nenhuma perimetral p desafogar transito, e se tivesse possivelmente a solução não seria derrubá-la
Aqui estamos sempre cometendo absurdos !!!
Abs
Teresa

Anônimo disse...

Ainda é possível impedir a destruição total. Para isso, é preciso reivindicar a manutenção do trecho que funciona, e aproveitar o que está em pé construindo alças. Não podemos abrir mão da Rodrigues Alves. Não podemos, abrir mão de passar de carro ou ônibus em cima da Perimetral e olhar o mar e uma belíssima paisagem. O projeto total quer deixar apenas o VLT no Centro da cidade, o que vai prejudicar mais ainda o nosso ir e vir com baldeações.